A Pesquisa de Moda e as Ciências Sociais: um diálogo necessário

É o tema do TCC recém-defendido por Mauryn Schirmer na UDESC. Ela relata e põe em discussão no texto abaixo:

Por Mauryn Schirmer

Dizia Françoise Vincent-Ricard, em seu livro As Espirais da Moda, que “estilistas são como aves migratórias, que aspiram o que flutua no ar com todos os sentidos em alerta”. Como recém-formada em Moda, pela Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC, em Florianópolis, não dá para passar batido por esta afirmação, freqüentemente citada no discurso de alguns teóricos da Moda, sem ao menos questionar-se como as tendências são “captadas no ar” por alguns estilistas, caçadores de tendências, ou mesmo “antenas”?
Em meu Trabalho de Conclusão de Curso, “A Pesquisa de Moda e as Ciências Sociais: um diálogo necessário”, desenvolvido a partir da necessidade de se estabelecer um diálogo entre as reflexões que eu vinha fazendo na área de Pesquisa de Moda, os conhecimentos que fui adquirindo nas disciplinas de Ciências Humanas sobre pesquisa e minhas experiências no campo profissional que acabavam por, invariavelmente, juntar estes dois pólos, é possível situar não somente esta e outras questões relacionadas ao fazer pesquisa, bem além de “sexto-sentido”, “faro”, e informações adquiridas virtualmente, em sites de pesquisa de tendências, na construção de um perfil de consumidor e identidade de marca (tudo em nome de uma moda globalizada).
Defini como objeto de estudo a Pesquisa de Moda, buscando tanto a literatura do campo da Moda, como a forma que o tema aparece na mídia, e como é visto pelos estudantes do curso de Moda da UDESC. Para fazer o estudo, lancei mão de várias estratégias metodológicas (entrevistas, questionários, investigação de documentos, observação participante, etc.) e teorias das ciências humanas, procurando dialogar com alguns dos conceitos na área de pesquisa e apontando alguns métodos e técnicas comuns aos dois campos do conhecimento.
Dividindo-se em três capítulos, no primeiro foi necessário estruturar o trabalho a partir de uma perspectiva histórica remetendo ao início do processo de autonomização do criador de moda no contexto moderno, a influência do olhar (e gosto pessoal) deste sobre suas clientes, a construção do olhar na interação social, no comportamento das pessoas e na moda, bem como a diferença de “olhar e captar” para a observação como método. O conceito sobre tendência e suas variações (megatendências, macrotendências, microtendências, etc.) são explanados a partir do ponto de vista de intelectuais, profissionais e estudantes de moda, e numa tentativa de destrinchar tais significados, busco saber no que estes implicam e como se relacionam com a forma de fazer pesquisa de moda.
No segundo capítulo, procurei falar sobre as diferentes metodologias de pesquisa utilizadas por birôs de estilo, agências ou sites especialistas em pesquisa de tendência, e por escritórios de pesquisa de comportamento, especialistas em macrotendências, como o Observatório de Sinais, do qual parti para a pesquisa prática, a experiência de estágio, relatada no início deste capítulo. No terceiro, é possível observar quais significados alguns termos e conceitos assumem, na visão de estudantes de moda, ao discorrerem sobre a pesquisa de moda, as tendências e macrotendências, ao papel do indivíduo em suas pesquisas, bem como ao que para estas contribuem as Ciências Sociais, vista por alguns estudantes como fora da “forma moda” por sua linguagem “distante da utilizada pelos fashionistas”. Preconceito tanto de um lado quanto de outro, ao me deparar com a preguiça epistemológica de alguns profissionais das Sociais na pouca convivência com o universo dos estudantes de moda, e de forma ainda mais grave, com o universo da Moda.
Se por um lado parecia estar já um tanto longe da história contada por Lipovetsky na introdução do livro O Império do efêmero, onde o autor narra sua dificuldade para defender a moda como objeto de pesquisa acadêmica legítimo, no campo das Ciências Humanas, por outro, a confusão conceitual no campo da pesquisa de moda, as reclamações e dificuldade de diálogo em torno destas duas áreas pareciam apontar ainda para o desencontro, ou, no mínimo, para a dificuldade deste encontro.
Quanto à frase de Vincent-Ricard citada no início deste texto, é possível perceber que nela permanece a idéia de “alguém especial”, seja o artista com sua sensibilidade e o “bom radar” com seu instinto. Neste sentido, aquele que “capta as tendências” não o faz por ter aprendido a fazê-lo, mas por uma espécie de “dom” especial. Cabe então deixar claro que quando falo de pesquisa de moda, trata-se de algo que deveria, em tese, ser diferente da concepção descrita acima, e também não uma “receita pronta” como se aprende na Universidade.
A pesquisa envolve um tipo de percepção e de construção do olhar, para compreender o contexto social no qual se insere, mas também com capacidade de estranhamento e reflexão sobre este contexto, sobre os valores que o caracterizam, sobre os desejos que são negociados e criados por aqueles que nele vivem. Mais do que “adivinhar o momento”, ou “captar sinais”, o pesquisador de moda não é apenas alguém sensível, observador e criativo, ainda que estas sejam características fundamentais para um bom pesquisador. Ao levantarem-se questões sobre a pesquisa de moda e termos relacionados, é clara a importância das Ciências Sociais ao se pensar a Moda. Pretendo considerar, ao enfatizar tal importância, que não somente através do que pude constatar em exercícios, leituras e práticas da pesquisa social, a qual me serviu de bússola, mas também pela amplitude reflexiva e de olhar que nos são estimuladas.

Para ler o trabalho na íntegra, favor entrar em contato através do email: eumaush@hotmail.com

Odes
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